A HISTÓRIA DO ITALO-WESTERN, MAIS CONHECIDO POR SPAGHETTI-WESTERN
O que é um spaghetti western (faroeste italiano) ?
O spaghetti-western nasceu na primeira metade dos anos sessenta e durou até à segunda metade dos anos setenta. Esta designação deve-se ao facto de que a maioria destes filmes terem sido realizados e produzidos por italianos, frequentemente em colaboração com outros países europeus, principalmente Espanha e Alemanha. O nome 'spaghetti-western' foi originalmente um termo depreciativo, dado pela crítica estrangeira a estes filmes, que consideravam inferiores aos westerns americanos. A maioria dos filmes foram feitos com orçamentos baixos, mas vários conseguiram ainda assim ser inovadores e artísticos, ainda que nesse período não tenham recebido muito reconhecimento, até mesmo na Europa. Na década de oitenta a reputação do género cresceu e actualmente o termo não é já usado de forma depreciativa. Ainda assim alguns italianos preferem continuar a chamar-lhes ‘western all’italiana’ (westerns à italiana). No Japão, eles são chamados ‘Macarroni westerns’, na Alemanha ‘Italowestern’ e "Chourizo Western" em Espanha.
O que há de tão especial nele?
É muitas vezes afirmado que o género surgiu como resposta ao enorme sucesso de Sergio Leone, Por um punhado de dólares (1964), uma adaptação de um filme de samurais japonês chamado Yojimbo (Akira Kurosawa, 1961). Mas um punhado de westerns haviam já sido feitos em Itália antes que Leone redefinisse o género. E os italianos nem foram os primeiros a fazer westerns na Europa na década de sessenta. Na Alemanha, uma série de westerns de imenso sucesso baseados na obra de Karl May haviam já sido produzidos. Sendo que o primeiro western europeu a ter pelo menos alguns dos ingredientes normalmente associados ao 'western spaghetti', foi feito sem qualquer envolvimento italiano, tratando-se de uma co-produção Inglesa/Espanhola: Tierra brutal (Michael Carreras, 1962).
Mas foi certamente Sergio Leone que definiu o olhar e a atitude do género, com seu primeiro western Por um punhado de dólares (1964) e os dois que se seguiriam: Por mais alguns dólares (1965) e O Bom, o mau e o vilão (1966). Reunidos, esses filmes são usualmente designados ‘A Trilogia dos dólares’. O oeste de Leone era um deserto poeirento de aldeias caiadas de branco, ventos uivantes, cães magricelas e cínicos heróis - tão barbudos como os vilões.
Todos os três filmes tiveram bandas sonoras compostas por Ennio Morricone, a sua música era tão pouco comum quanto as imagens de Leone: ele não só utilizava instrumentos como a trompete, a harpa e a guitarra eléctrica, mas também adicionava assobios, chicotes e tiros à mistura - descrito por um crítico como uma "rattlesnake in a drumkit”. Morricone haveria de compor mais de 30 bandas sonoras para westerns italianos e foi um factor chave para o sucesso do género.
Em geral os westerns-spaghetti são mais orientados para a acção do que suas parceiros americanos. Os diálogos são escassos e alguns críticos têm apontado que foram construídos como óperas, utilizando a música como um ingrediente ilustrativo da narrativa. Durante anos os westerns haviam sido chamados de 'horse opera’, mas como o professor de estudos culturais - Christopher Frayling - salientou, foram os italianos a demonstrar o que o termo realmente significa.
Nessa época bastantes westerns foram lançados, muitos deles bastante violentos, o que lhes valeria diversos problemas com a censura. Levando-os a ser cortados ou mesmo proibidos em determinados mercados. Muitos destes westerns-spaghetti têm como palco a fronteira Americano-Mexicana e continham bandidos mexicanos sádicos e barulhentos. A Guerra Civil Americana e as suas consequências são outro panorama frequentemente usado. Em vez dos usuais nomes como Will Kane ou Ethan Edwards, os heróis muitas vezes têm nomes estranhos como Ringo, Sartana, Sabata, Johnny Oro, Arizona Colt ou Django.
O género é inegavelmente um género católico (alguns nomes frequentemente usados são Aleluia, Cemitério, Trindade e Água Benta Joe!), com um estilo visual fortemente influenciado pela iconografia católica. Por exemplo: a crucificação, a última ceia ou o ecce homo (Eis o homem). A surreal extravagancia Django mata! (Se sei vivo, Spara, 1967) de Giulio Questi, um ex-assistente de Fellini(!), tem como herói um tipo ressuscitado que testemunha o Dia do Julgamento numa empoeirada cidade ocidental.
As cenas exteriores de muitos westerns-spaghetti, especialmente aqueles com um orçamento relativamente maior, foram filmadas em Espanha. Especialmente no deserto de Tabernas (Almeria, Andaluzia), Colmenar Viejo e Hoyo de Manzanares (perto de Madrid). Na Itália, a província de Lazio (arredores de Roma) foi o local favorito. Alguns westerns-spaghetti foram também filmados nos Alpes, Norte de África ou Israel. Já as cenas de interiores eram geralmente filmadas nas cidades western dos estúdios de Roma, como o Cinecittà ou o Elios. Os estúdios Elios continham também uma "cidade mexicana" próxima da "cidade americana".
Uma breve história
# Primórdios
Os westerns sempre foram populares em Itália. Alguns westerns foram mesmo produzidos durante a Segunda Guerra Mundial, quando o governo fascista excluía os westerns americanos dos cinemas italianos. Como é o caso Il Fanciullo del West (1942) de Giorgio Ferroni, que haveria de realizar diversos westerns-spaghetti durante o auge do género. Mas na década de sessenta a ausência de westerns americanos nos cinemas europeus tinha outra razão: alguns dos mais importantes realizadores do género, como John Ford ou Anthony Mann haviam sido relegados para trabalhos na televisão.
Os filmes baseados na obra de Karl May criaram um contexto cultural e financeiro interessante para a produção em larga escala de westerns na Europa. Os primeiros exemplares de westerns italianos produzidos nos anos sessenta, assemelhavam-se com westerns americanos de série B, com elencos e equipas escamoteadas atrás de pseudónimos americanos. “Por um punhado de dólares” de Leone foi produzido simultaneamente com Le Pistole non discutono de Mario Caiano. Enquanto Leone redefinia o género western, Caiano contava uma história clássica ocidental sobre o xerife Pat Garret, e quando Caiano contratava um veterano actor americano (Rod Cameron), Leone escolhia um actor jovem chamado Clint Eastwood.
Numa fase em que o género ainda estava na sua infância, muitos dos filmes produzidos nesse ano de transição – 1965 – misturavam influências americanas com italianas. Filmes esses como Uma pistola para Ringo e O regresso de Ringo ambos realizados por Duccio Tessari e com Giuliano Gemma, a primeira mega estrela italiana do género. Leone chegou ainda a assinar a versão internacional de “Por um punhado de dólares” com o pseudónimo americanizado Bob Robertson. O primeiro italiano a assinar um western-spaghetti com o seu próprio nome seria Sergio Corbucci, em Seis balas assassinas (1965).
# Os anos de Glória: 1966 - 1968
Neste breve período foi feita a maioria dos filmes que se tornariam clássicos. Em 1966 Leone fez O Bom, o mau e o vilão, geralmente considerado como o spaghetti-western por excelência, e agora considerado por muitos como o melhor western já feito. Outro marco foi o pioneiro Django de Sergio Corbucci (muitas vezes chamado de "o outro Sergio"), que se tornou no protótipo do conto de vingança e gerou diversos filmes com 'Django' no título. Em 1968, esses dois realizadores mostraram mais duas obras-primas indiscutíveis do género: Leone fez o lendário Aconteceu no oeste, o primeiro western-spaghetti a atrair a atenção dos chamados críticos “sérios”, e Corbucci fez o devastador O grande Silêncio , que foi totalmente filmado na neve e subverteu praticamente todas as convenções de género, entre eles o cliché de que o bonzinho sempre vence no final.
Outro realizador do período dourado do género foi Sergio Sollima (o terceiro Sergio), o mais intelectual e politicamente empenhada de todos os realizadores do western-spaghetti. O seu O grande pistoleiro (1966), com Lee van Cleef - que também apareceu em dois dos três filmes da Trilogia do Dólar - é um conto sobre a luta de classes, bem como uma desconstrução da mitologia do pistoleiro da lei. Cara a cara (1967) é a história de um professor da faculdade de New England, que viaja para o sul e descobre seu instinto violento quando está refém de um bandido. O professor é interpretado por Gian Maria Volonté - outro veterano de Leone - enquanto o bandido é desempenhado pelo actor cubano-americano Tomas Milian.
Volonté também apareceu no "Mercenário - Quién sabe?" (1966) de Damiano Damiani, um filme que deu o mote para uma série de westerns políticos com acção no México, durante as várias revoluções mexicanas, os chamados "westerns Zapata” (ocasionalmente chamados de "tortilla-westerns). Tomas Milian haveria de aparecer em muitos desses westerns Zapata, sempre como um peão, um agricultor mexicano feito revolucionário. Nas suas próprias palavras, ele tornou-se num "símbolo da pobreza e da revolução". Situado no México, e filmado num estilo barroco ocidental, os westerns Zapata pareciam no entanto mais preocupados com politicas europeais do que americanas (do Norte ou Latinas).
Na década de sessenta os ideais marxistas estavam largamente difundidas entre os intelectuais europeus, especialmente nos países do Mediterrâneo, e os westerns Zapata pareciam reflectir as ideias revolucionárias que viviam dentro deles. Sendo mais sofisticados e intelectuais que a maioria dos westerns "comuns", os Zapata westerns eram populares entre os estudantes. Mas eram também muito populares entre o público do terceiro mundo. Entre os melhores Zapatas estão Tepepa de Gulio Petroni e, O pistoleiro profissional de Sergio Corbucci (ambos lançados em 1968).
1969 mostrou um declínio no número de westerns produzidos, e uma tendência para parodiar o género, já anunciado no ano anterior mas agora mais evidente, especialmente nos filmes da saga Sartana - muitas vezes chamados como a resposta do western-spaghetti aos filmes de James Bond.
# Período cómico
Em 1970, Enzo Barboni, que havia sido o director de fotografia no Django de Corbucci, fez Trinitá, o Cowboy insolente. O que era paródia tornava-se agora palhaçada, e o filme tornou-se um êxito estrondoso em todo o mundo. Marcando também o início de um novo período dourado, não tanto para o western-spaghetti, mas pelo menos para a indústria cinematográfica italiana. Numerosos westerns cómicos foram produzidos e os actores Terence Hill e Bud Spencer tornaram-se ambos estrelas internacionais. Em geral, os fãs do género western-spaghetti não são grandes apreciadores destas comédias, mas os filmes da saga Trinitá são bastante divertidos, e o segundo filme Continuaram a chamar-me Trinitá foi mesmo o filme mais bem sucedido do western italiano desde o seu surgimento.
Meu nome é ninguém, realizado por Tonino Valerii (supervisionado por Leone), é um devaneio serio-cómico sobre o fim do western. Alguns filmes misturaram também os elementos do western-spaghetti com os filmes de artes marciais de Hong Kong. Normalmente com uma estrela oriental a surgir no faroeste, mas nenhum desses filmes se tornou um verdadeiro clássico.
Ainda que dominados pelos westerns cómicos, alguns westerns sérios foram também produzidos na primeira metade dos anos setenta. Corbucci fez Companheiros, uma espécie de sequela do seu O pistoleiro profissional (1968), enquanto que Leone fez Aguenta-te canalha (1971), um exercício um pouco diferente sobre os westerns-spaghetti políticos.
# Crepúsculo
Quando tudo parecia acabado, o género teve o seu último fôlego com os chamados spaghettis-crepusculares. Westerns sérios, artísticos e melancólicos, que glorificaram (e fizeram o luto) tanto o final do género, como a decadência da indústria western italiana. Estes filmes foram parcialmente filmados nas cidades do oeste - agora em ruínas - dos estúdios romanos que haviam produzido dezenas de westerns em cada ano da década anterior. Dois dos melhores spaghettis-crepusculares são Califórnia de Michele Lupo, com Giuliano Gemma, uma das primeiras e maiores estrelas italianas do género, e Keoma, realizado pelo prolífico Enzo G. Castellari e protagonizado por Franco Nero, que havia representado Django uma década antes.
Hoje
Uma nova geração de cineastas, representada por gente como Quentin Tarantino e Robert Rodriguez têm redescoberto e abraçado o género, introduzindo elementos nos seus próprios argumentos e desenvolvendo um estilo visual influenciado pelos mestres italianos dos anos sessenta. Ao mesmo tempo, veteranos do cinema como Martin Scorsese, Steven Spielberg, e claro Clint Eastwood, têm confirmado a sua grande admiração por Sergio Leone - que é hoje universalmente reconhecido como um dos maiores cineastas de todos os tempos. Ennio Morricone recebeu em 2007 um um 'Oscar' honorário, pela "sua magnífica e multifacetada contribuição à arte da música para filmes”. Clint Eastwood ficou ao seu lado na cerimónia. Tinham-se encontrado dois dias antes, pela primeira vez em 40 anos. A introdução do DVD nos dias de hoje contribuiu muito para o género, pela primeira vez as novas gerações puderam ver os filmes na sua beleza panorâmica completa. E embora ainda haja muito material perdido, os filmes mais importantes estão agora disponíveis em DVD.
O que é um spaghetti western (faroeste italiano) ?
O spaghetti-western nasceu na primeira metade dos anos sessenta e durou até à segunda metade dos anos setenta. Esta designação deve-se ao facto de que a maioria destes filmes terem sido realizados e produzidos por italianos, frequentemente em colaboração com outros países europeus, principalmente Espanha e Alemanha. O nome 'spaghetti-western' foi originalmente um termo depreciativo, dado pela crítica estrangeira a estes filmes, que consideravam inferiores aos westerns americanos. A maioria dos filmes foram feitos com orçamentos baixos, mas vários conseguiram ainda assim ser inovadores e artísticos, ainda que nesse período não tenham recebido muito reconhecimento, até mesmo na Europa. Na década de oitenta a reputação do género cresceu e actualmente o termo não é já usado de forma depreciativa. Ainda assim alguns italianos preferem continuar a chamar-lhes ‘western all’italiana’ (westerns à italiana). No Japão, eles são chamados ‘Macarroni westerns’, na Alemanha ‘Italowestern’ e "Chourizo Western" em Espanha.
O que há de tão especial nele?
É muitas vezes afirmado que o género surgiu como resposta ao enorme sucesso de Sergio Leone, Por um punhado de dólares (1964), uma adaptação de um filme de samurais japonês chamado Yojimbo (Akira Kurosawa, 1961). Mas um punhado de westerns haviam já sido feitos em Itália antes que Leone redefinisse o género. E os italianos nem foram os primeiros a fazer westerns na Europa na década de sessenta. Na Alemanha, uma série de westerns de imenso sucesso baseados na obra de Karl May haviam já sido produzidos. Sendo que o primeiro western europeu a ter pelo menos alguns dos ingredientes normalmente associados ao 'western spaghetti', foi feito sem qualquer envolvimento italiano, tratando-se de uma co-produção Inglesa/Espanhola: Tierra brutal (Michael Carreras, 1962).
Mas foi certamente Sergio Leone que definiu o olhar e a atitude do género, com seu primeiro western Por um punhado de dólares (1964) e os dois que se seguiriam: Por mais alguns dólares (1965) e O Bom, o mau e o vilão (1966). Reunidos, esses filmes são usualmente designados ‘A Trilogia dos dólares’. O oeste de Leone era um deserto poeirento de aldeias caiadas de branco, ventos uivantes, cães magricelas e cínicos heróis - tão barbudos como os vilões.
Todos os três filmes tiveram bandas sonoras compostas por Ennio Morricone, a sua música era tão pouco comum quanto as imagens de Leone: ele não só utilizava instrumentos como a trompete, a harpa e a guitarra eléctrica, mas também adicionava assobios, chicotes e tiros à mistura - descrito por um crítico como uma "rattlesnake in a drumkit”. Morricone haveria de compor mais de 30 bandas sonoras para westerns italianos e foi um factor chave para o sucesso do género.
Em geral os westerns-spaghetti são mais orientados para a acção do que suas parceiros americanos. Os diálogos são escassos e alguns críticos têm apontado que foram construídos como óperas, utilizando a música como um ingrediente ilustrativo da narrativa. Durante anos os westerns haviam sido chamados de 'horse opera’, mas como o professor de estudos culturais - Christopher Frayling - salientou, foram os italianos a demonstrar o que o termo realmente significa.
Nessa época bastantes westerns foram lançados, muitos deles bastante violentos, o que lhes valeria diversos problemas com a censura. Levando-os a ser cortados ou mesmo proibidos em determinados mercados. Muitos destes westerns-spaghetti têm como palco a fronteira Americano-Mexicana e continham bandidos mexicanos sádicos e barulhentos. A Guerra Civil Americana e as suas consequências são outro panorama frequentemente usado. Em vez dos usuais nomes como Will Kane ou Ethan Edwards, os heróis muitas vezes têm nomes estranhos como Ringo, Sartana, Sabata, Johnny Oro, Arizona Colt ou Django.
O género é inegavelmente um género católico (alguns nomes frequentemente usados são Aleluia, Cemitério, Trindade e Água Benta Joe!), com um estilo visual fortemente influenciado pela iconografia católica. Por exemplo: a crucificação, a última ceia ou o ecce homo (Eis o homem). A surreal extravagancia Django mata! (Se sei vivo, Spara, 1967) de Giulio Questi, um ex-assistente de Fellini(!), tem como herói um tipo ressuscitado que testemunha o Dia do Julgamento numa empoeirada cidade ocidental.
As cenas exteriores de muitos westerns-spaghetti, especialmente aqueles com um orçamento relativamente maior, foram filmadas em Espanha. Especialmente no deserto de Tabernas (Almeria, Andaluzia), Colmenar Viejo e Hoyo de Manzanares (perto de Madrid). Na Itália, a província de Lazio (arredores de Roma) foi o local favorito. Alguns westerns-spaghetti foram também filmados nos Alpes, Norte de África ou Israel. Já as cenas de interiores eram geralmente filmadas nas cidades western dos estúdios de Roma, como o Cinecittà ou o Elios. Os estúdios Elios continham também uma "cidade mexicana" próxima da "cidade americana".
Uma breve história
# Primórdios
Os westerns sempre foram populares em Itália. Alguns westerns foram mesmo produzidos durante a Segunda Guerra Mundial, quando o governo fascista excluía os westerns americanos dos cinemas italianos. Como é o caso Il Fanciullo del West (1942) de Giorgio Ferroni, que haveria de realizar diversos westerns-spaghetti durante o auge do género. Mas na década de sessenta a ausência de westerns americanos nos cinemas europeus tinha outra razão: alguns dos mais importantes realizadores do género, como John Ford ou Anthony Mann haviam sido relegados para trabalhos na televisão.
Os filmes baseados na obra de Karl May criaram um contexto cultural e financeiro interessante para a produção em larga escala de westerns na Europa. Os primeiros exemplares de westerns italianos produzidos nos anos sessenta, assemelhavam-se com westerns americanos de série B, com elencos e equipas escamoteadas atrás de pseudónimos americanos. “Por um punhado de dólares” de Leone foi produzido simultaneamente com Le Pistole non discutono de Mario Caiano. Enquanto Leone redefinia o género western, Caiano contava uma história clássica ocidental sobre o xerife Pat Garret, e quando Caiano contratava um veterano actor americano (Rod Cameron), Leone escolhia um actor jovem chamado Clint Eastwood.
Numa fase em que o género ainda estava na sua infância, muitos dos filmes produzidos nesse ano de transição – 1965 – misturavam influências americanas com italianas. Filmes esses como Uma pistola para Ringo e O regresso de Ringo ambos realizados por Duccio Tessari e com Giuliano Gemma, a primeira mega estrela italiana do género. Leone chegou ainda a assinar a versão internacional de “Por um punhado de dólares” com o pseudónimo americanizado Bob Robertson. O primeiro italiano a assinar um western-spaghetti com o seu próprio nome seria Sergio Corbucci, em Seis balas assassinas (1965).
# Os anos de Glória: 1966 - 1968
Neste breve período foi feita a maioria dos filmes que se tornariam clássicos. Em 1966 Leone fez O Bom, o mau e o vilão, geralmente considerado como o spaghetti-western por excelência, e agora considerado por muitos como o melhor western já feito. Outro marco foi o pioneiro Django de Sergio Corbucci (muitas vezes chamado de "o outro Sergio"), que se tornou no protótipo do conto de vingança e gerou diversos filmes com 'Django' no título. Em 1968, esses dois realizadores mostraram mais duas obras-primas indiscutíveis do género: Leone fez o lendário Aconteceu no oeste, o primeiro western-spaghetti a atrair a atenção dos chamados críticos “sérios”, e Corbucci fez o devastador O grande Silêncio , que foi totalmente filmado na neve e subverteu praticamente todas as convenções de género, entre eles o cliché de que o bonzinho sempre vence no final.
Outro realizador do período dourado do género foi Sergio Sollima (o terceiro Sergio), o mais intelectual e politicamente empenhada de todos os realizadores do western-spaghetti. O seu O grande pistoleiro (1966), com Lee van Cleef - que também apareceu em dois dos três filmes da Trilogia do Dólar - é um conto sobre a luta de classes, bem como uma desconstrução da mitologia do pistoleiro da lei. Cara a cara (1967) é a história de um professor da faculdade de New England, que viaja para o sul e descobre seu instinto violento quando está refém de um bandido. O professor é interpretado por Gian Maria Volonté - outro veterano de Leone - enquanto o bandido é desempenhado pelo actor cubano-americano Tomas Milian.
Volonté também apareceu no "Mercenário - Quién sabe?" (1966) de Damiano Damiani, um filme que deu o mote para uma série de westerns políticos com acção no México, durante as várias revoluções mexicanas, os chamados "westerns Zapata” (ocasionalmente chamados de "tortilla-westerns). Tomas Milian haveria de aparecer em muitos desses westerns Zapata, sempre como um peão, um agricultor mexicano feito revolucionário. Nas suas próprias palavras, ele tornou-se num "símbolo da pobreza e da revolução". Situado no México, e filmado num estilo barroco ocidental, os westerns Zapata pareciam no entanto mais preocupados com politicas europeais do que americanas (do Norte ou Latinas).
Na década de sessenta os ideais marxistas estavam largamente difundidas entre os intelectuais europeus, especialmente nos países do Mediterrâneo, e os westerns Zapata pareciam reflectir as ideias revolucionárias que viviam dentro deles. Sendo mais sofisticados e intelectuais que a maioria dos westerns "comuns", os Zapata westerns eram populares entre os estudantes. Mas eram também muito populares entre o público do terceiro mundo. Entre os melhores Zapatas estão Tepepa de Gulio Petroni e, O pistoleiro profissional de Sergio Corbucci (ambos lançados em 1968).
1969 mostrou um declínio no número de westerns produzidos, e uma tendência para parodiar o género, já anunciado no ano anterior mas agora mais evidente, especialmente nos filmes da saga Sartana - muitas vezes chamados como a resposta do western-spaghetti aos filmes de James Bond.
# Período cómico
Em 1970, Enzo Barboni, que havia sido o director de fotografia no Django de Corbucci, fez Trinitá, o Cowboy insolente. O que era paródia tornava-se agora palhaçada, e o filme tornou-se um êxito estrondoso em todo o mundo. Marcando também o início de um novo período dourado, não tanto para o western-spaghetti, mas pelo menos para a indústria cinematográfica italiana. Numerosos westerns cómicos foram produzidos e os actores Terence Hill e Bud Spencer tornaram-se ambos estrelas internacionais. Em geral, os fãs do género western-spaghetti não são grandes apreciadores destas comédias, mas os filmes da saga Trinitá são bastante divertidos, e o segundo filme Continuaram a chamar-me Trinitá foi mesmo o filme mais bem sucedido do western italiano desde o seu surgimento.
Meu nome é ninguém, realizado por Tonino Valerii (supervisionado por Leone), é um devaneio serio-cómico sobre o fim do western. Alguns filmes misturaram também os elementos do western-spaghetti com os filmes de artes marciais de Hong Kong. Normalmente com uma estrela oriental a surgir no faroeste, mas nenhum desses filmes se tornou um verdadeiro clássico.
Ainda que dominados pelos westerns cómicos, alguns westerns sérios foram também produzidos na primeira metade dos anos setenta. Corbucci fez Companheiros, uma espécie de sequela do seu O pistoleiro profissional (1968), enquanto que Leone fez Aguenta-te canalha (1971), um exercício um pouco diferente sobre os westerns-spaghetti políticos.
# Crepúsculo
Quando tudo parecia acabado, o género teve o seu último fôlego com os chamados spaghettis-crepusculares. Westerns sérios, artísticos e melancólicos, que glorificaram (e fizeram o luto) tanto o final do género, como a decadência da indústria western italiana. Estes filmes foram parcialmente filmados nas cidades do oeste - agora em ruínas - dos estúdios romanos que haviam produzido dezenas de westerns em cada ano da década anterior. Dois dos melhores spaghettis-crepusculares são Califórnia de Michele Lupo, com Giuliano Gemma, uma das primeiras e maiores estrelas italianas do género, e Keoma, realizado pelo prolífico Enzo G. Castellari e protagonizado por Franco Nero, que havia representado Django uma década antes.
Hoje
Uma nova geração de cineastas, representada por gente como Quentin Tarantino e Robert Rodriguez têm redescoberto e abraçado o género, introduzindo elementos nos seus próprios argumentos e desenvolvendo um estilo visual influenciado pelos mestres italianos dos anos sessenta. Ao mesmo tempo, veteranos do cinema como Martin Scorsese, Steven Spielberg, e claro Clint Eastwood, têm confirmado a sua grande admiração por Sergio Leone - que é hoje universalmente reconhecido como um dos maiores cineastas de todos os tempos. Ennio Morricone recebeu em 2007 um um 'Oscar' honorário, pela "sua magnífica e multifacetada contribuição à arte da música para filmes”. Clint Eastwood ficou ao seu lado na cerimónia. Tinham-se encontrado dois dias antes, pela primeira vez em 40 anos. A introdução do DVD nos dias de hoje contribuiu muito para o género, pela primeira vez as novas gerações puderam ver os filmes na sua beleza panorâmica completa. E embora ainda haja muito material perdido, os filmes mais importantes estão agora disponíveis em DVD.
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